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Qual a melhor referência para os Fundos Multimercados?

Danilo Brito, CFP®

Diante de momentos peculiares em nossa economia e com uma taxa Selic no seu menor patamar da história (2%aa), surge uma questão relevante para os investidores: qual a eficácia em se utilizar o CDI como benchmark para investimentos de risco moderado, principalmente para fundos Multimercados Livre? Vamos analisar uma opção interessante que podemos utilizar para esses fundos de investimentos.


O que é um benchmark?

Benchmark nada mais é que “um indexador de largo uso e que funciona como referência” (Fortuna, 2017). Em outras palavras, é uma parâmetro para sabermos se nosso investimento está indo bem ou não, de acordo com o mercado onde investimos. Na indústria de fundos de investimentos, por exemplo, é amplamente utilizado o Ibovespa (principal índice da bolsa brasileira) como benchmark (referência) para os fundos de Ações Long Only. Para os fundos de investimentos que investem em títulos públicos atrelados à inflação, é utilizado o IMA-B. Já com os fundos de investimentos que aplicam em títulos públicos pré-fixados, utiliza-se o IRF-M. Já os fundos de investimentos conservadores, aqueles atrelados à taxa CDI, utilizam essa mesma taxa como parâmetro e os fundos Imobiliários (FII) utilizam o IFIX. Até aqui, podemos notar que sempre é comparado “banana com banana”, pois em um fundo conservador como os fundos DI, não posso utilizar como benchmark o Ibovespa, são riscos diferentes e mercados diferentes. Mas, como veremos adiante, nem sempre isso ocorre e principalmente em fundos multimercados.


A indústria de fundos multimercados no Brasil:

Fundos de Investimentos Multimercados são entidades organizadas sob a forma de condomínio onde o destino dos recursos é ser alocado em diversos ativos financeiros como ações, renda fixa, moedas, commodities entre outros. Ou seja, o gestor poderá diversificar a carteira em muitos mercados (sempre seguindo a política de investimento do fundo) para obter o melhor retorno. A Anbima – Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais – classifica os fundos multimercados por estratégias e riscos, para facilitar a escolha por parte do investidor. Temos os seguintes tipos de Fundos Multimercados: Multimercados Balanceados; Multimercados Dinâmico; Multimercados Capital Protegido; Multimercados Long and Short Neutro e Long and Short Direcional; Multimercados Macro; Multimercados Trading; Multimercados Livre; Multimercados Juros e Moedas; Multimercados Estratégia Específica e Multimercados Investimento no Exterior.

Na última década o número de fundos multimercados no Brasil cresceu mais de 100%. A média de crescimento de novos fundos entre 2006 e 2016 foi de 425 por ano. De 2017 até novembro de 2020 essa média subiu para 831. O Gráfico I mostra essa evolução e da indústria de fundos.


Gráfico I. Evolução quantidade total de Fundos de Investimentos (eixo da direita) e de Fundos Multimercados (eixo da esquerda). Dados acumulados até novembro 2020. Fonte Anbima. Elaboração do autor.


O Patrimônio Líquido (PL) seguiu a mesma tendência do número de fundos. O cenário de juros baixos que estamos vivenciando nos últimos anos somado à mudança do perfil dos investidores, que estão buscando conhecimento (embora ainda de forma tímida) e aceitando um maior risco nas suas aplicações, levou esses investidores a procurar opções mais sofisticadas e diversificadas, como é o caso dos fundos multimercados. O Gráfico II ilustra esse aumento de PL.


Gráfico II. Evolução do PL total de Fundos (eixo da esquerda) e da classe Multimercado (eixo da direita). Dados em R$ milhões acumulados até novembro 2020. Fonte Anbima. Elaboração do autor.


Abaixo, o Gráfico III nos mostra a força que a indústria de fundos de investimentos está demonstrando, com um aumento na captação líquida nos últimos anos. Como descrito no anuário da Indústria de Fundos de Investimentos 2020, elaborado pela FGV, “uma vez superado o triênio 2014-2016, caracterizado pela captação líquida decrescente, recessão econômica e a forte competição com ativos isentos de imposto de renda, como LCI e LCA, observamos agora 2 anos de entradas líquidas positivas e crescentes”.


Gráfico III. Captação líquida dos fundos multimercados e do total de fundos. Dados em R$ milhões acumulados até novembro 2020. Fonte Anbima. Elaboração do autor.


Dentro dos tipos de Fundos Multimercados, podemos observar a evolução do PL de dezembro de 2019 a novembro de 2020. Como já visto no Gráfico II, houve um crescimento da classe. No Gráfico IV observa-se a força dos fundos Multimercados do tipo Livre e Investimento no Exterior em comparação com os outros tipos.



Gráfico IV. Evolução do PL dos fundos multimercados total (linha e dados no eixo da esquerda) e por tipo Anbima. Dados em R$ milhões acumulados até novembro 2020. Fonte Anbima. Elaboração do autor.


Trouxe todos esses gráficos e informações para mostrar a importância da indústria de fundos e da classe de multimercado na nossa economia.

Dentre os fundos multimercados livres (aqueles que não possuem obrigatoriedade de concentração em nenhuma classe de ativos), escolhi randomicamente 6 fundos, entre os 20 maiores da indústria, para analisarmos alguns pontos. Os fundos são: Jgp Strategy Master FI MM; Kapitalo Master II FI MM; Itaú Seleção Multifundos MM FICFI; Itaú Hedge Plus MM FICFI; Safra Galileo Master FI MM; Occam Retorno Absoluto FI MM.


Utilizei a ferramenta Com Dinheiro para a busca dos dados e o período de análise foi de 10/07/2017 à 08/12/2020.

Abaixo veremos melhor esses fundos, mas a primeira coisa que chama a atenção é que a volatilidade (risco) média desses fundos é de 6,01%, enquanto que a taxa CDI é 0,12%. Mas isso não impede de ser amplamente utilizado como benchmark para os fundos multimercados no Brasil a taxa CDI. Ou seja, estamos comparando a performance de um investimento com risco com uma referência “sem risco”. Imagine comparar o retorno de um fundo de ações com a taxa Selic, na sua cabeça isso é inconcebível, pois são coisas totalmente distintas. Para sermos justos, utilizamos como benchmarks para fundos de ações índices compostos por “cestas” de ações, como por exemplo, o Ibovespa, o IBRX, IBRX-50. Quando observamos os fundos de renda fixa prefixados, também utilizamos como referência uma “cesta”, mas agora com títulos públicos de taxa pré, o IRF-M, por exemplo. Nos Fundos Imobiliários (FII) não é diferente. O IFIX é amplamente utilizado como benchmark para esses fundos. E o que é esse Ifix? Uma “cesta” composta por FIIs.


Creio que já deu para entender onde quero chegar!

Se fizermos uma analogia dos fundos de ações, prefixados e imobiliários com os multimercados livres, notamos que o benchmark amplamente utilizado por esses fundos foge do racional utilizado nos outros.


O IHFA

Segundo a Anbima, “o IHFA (Índice de Hedge Funds ANBIMA) é uma referência para a indústria de hedge funds. No Brasil, esses produtos se assemelham aos fundos multimercado de gestão ativa, com aplicações em diversos segmentos do mercado e várias estratégias de investimento. O índice conta com os fundos mais representativos do segmento em sua carteira. Para fazer parte, esses produtos devem atender a uma série de critérios bem definidos, por exemplo, cobrar taxa de performance, não ser fundo fechado, entre outros”. Ou seja, o IHFA é uma “cesta” composta pelos fundos multimercados mais representativos no mercado brasileiro.


Análise

Vamos analisar o comportamento dos fundos de investimentos e seus respectivos benchmarks. Para nossa análise, utilizei 6 fundos de ações, 5 prefixados, 4 FIIs e 6 multimercados livre, os primeiros utilizando como benchmark o Ibovespa, IRF-M e IFIX, nessa ordem, e o último utilizando o CDI e o IHFA. Todos escolhidos randomicamente.

Observe os gráficos a seguir:


Gráfico V. Retorno acumulado dos Fundos de Ações e o Ibovespa. Fonte site Com Dinheiro. Elaboração do autor.


Gráfico VI. Retorno acumulado dos Fundos de Renda Fixa Prefixados e o IRF-M. Fonte: site Com Dinheiro. Elaboração do autor.


Gráfico VII. Retorno acumulado dos Fundos Imobiliários e do IFIX. Fonte: site Com Dinheiro. Elaboração do autor.


Embora não seja uma condição essencial para a escolha de um benchmark, veja que temos uma forte correlação entre os fundos e seus benchmarks. Nos fundos de ações temos:

  • Fundo Itaú Ações Dunamis FICFI com uma correlação de 0,97 com o Ibovespa;

  • Moat Capital FICFI Em Ações com 0,96 do Ibovespa;

  • Brasil Capital 30 FICFI Em Ações com 0,93 do Ibovespa;

  • Rt Constellation FIA com 0,99 do Ibovespa;

  • Spx Falcon Master FIA com 0,94 do Ibovespa e

  • Itaú Momento Ações - FI com 0,96 do Ibovespa.

Para os fundos Prefixados e Imobiliários não é diferente a relação:

  • Os fundos BB Top RF Agressivo Pre FI RF LP; FI Caixa Brasil Irf-M Titulos Publicos RF LP; BB RF LP Prefixado FICFI ; Itaú RF Pré LP – FI e Santander FI Irf-M Tít Pub RF possuem uma correlação de 0,99 com o IRF-M;

  • O FII BRCR11 possui uma correlação de 0,60 com o IFIX;

  • O JSRE11 possui uma correlação de 0,61 com o IFIX;

  • O KNHY11 possui uma correlação de 0,53 com o IFIX e

  • O CXRI11 possui uma correlação de 0,36 com o IFIX.

Observemos agora o que ocorre com os fundos multimercados livres:


Gráfico VIII. Retorno acumulado dos Fundos Multimercados Livres e do CDI. Fonte: site Com Dinheiro. Elaboração do autor.


Quando o benchmark é a taxa CDI, a correlação entre os fundos e essa taxa é:

  • Jgp Strategy Master FI MM é 0,01;

  • Kapitalo Master II FI MM é 0,02;

  • Itaú Seleção Multifundos MM FICFI é 0,05;

  • Itaú Hedge Plus MM FICFI é 0,01;

  • Safra Galileo Master FI MM é 0,02;

  • Occam Retorno Absoluto FI MM é 0,03.

Note a diferença com o que ocorre nos exemplos anteriores. Todos os 6 fundos analisados, colocados ao lado do CDI possui uma correlação próxima a zero.


Vejamos o que ocorre se utilizamos o IHFA como referência:



Gráfico IX. Retorno acumulado dos Fundos Multimercados Livres e do IHFA. Fonte: site Com Dinheiro. Elaboração do autor.


Ao observarmos o gráfico já conseguimos ver a diferença. Vejamos como fica as correlações dos fundos com o IHFA:

  • Jgp Strategy Master FI MM é 0,36;

  • Kapitalo Master II FI MM é 0,81;

  • Itaú Seleção Multifundos MM FICFI é 0,92;

  • Itaú Hedge Plus MM FICFI é -0,10;

  • Safra Galileo Master FI MM é 0,72;

  • Occam Retorno Absoluto FI MM é 0,59.

Nesse último caso, a utilização do IHFA como benchmark faz com que a correlação seja muito maior que se for o CDI. Como disse, a correlação não é o fator determinante para a escolha do índice de referência, porém fizermos a analogia com os outros mercados vistos nesse texto, é muito mais coerente utilizarmos o IHFA ao invés do CDI.


Observando por outra ótica, mas ainda assim fazendo a correspondência com os fundos de Ações, Imobiliários e Pré que vimos anteriormente, todos eles utilizam como referência uma “cesta” composta por ativos que representam o mercado de atuação (comparar “banana com banana”), inclusive com o nível de risco (volatilidade) parecido. Nos fundos Multimercados Livres, na minha visão, faz muito mais sentido utilizarmos igualmente uma “cesta” composta por ativos que representa o mercado e que possua uma volatilidade correspondente, e não utilizarmos o CDI com um dos menores riscos do mercado.


Conclusão

Sei que o a taxa CDI, no longo prazo, foi muito difícil de ser superada, isso olhando o histórico de taxa de juros no Brasil acima de dois dígitos. Porém, com as recentes quedas na taxa básica de juros (juros de curto prazo) e com os juros de 10 anos estando abaixo de 8%aa (pelo menos no momento em que escrevo esse texto), é justo questionarmos a viabilidade da utilização dessa taxa como referência para os fundos Multimercados Livres. Aqui trago como alternativa o IHFA que foi elaborado para ser a referência para esses fundos no mercado brasileiro. O objetivo da análise foi observar alguns pontos que são vistos em outros mercados (Fundos de Ações, Pré e Imobiliários) como a correlação entre os fundos e seus benchmarks, a composição e a volatilidade dessas referências e dos fundos. Não vemos esses mesmos pontos sendo levados em conta quando utilizamos o CDI como referência, mas o observamos quando utilizamos o IHFA. Por conta disso aparenta ser mais viável utilizarmos o IHFA como principal referência para o Fundos Multimercados Livres.


Por Danilo Brito


Danilo é graduado em Matemática e pós-graduado em Finanças, Investimentos e Banking pela PUC. É Especialista de Investimentos certificado pela Anbima e Planejador Financeiro certificado pela Planejar.

Possui vasta experiência na área de investimentos com passagens pelos bancos Santander, Itaú e Bradesco. Tem artigos publicados no jornal Folha Metropolitana de Guarulhos.


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